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Informatizando o Consultório
Médico
Guilherme Del Fiol e Lucio Jorge Dias Matias
A
revolução iniciada com o advento dos microcomputadores
tende a gerar um certo grau de ansiedade nas pessoas que não estão
habituadas a estas tecnologias. Esta ansiedade, em parte, é causada
pelo desconhecimento de quais benefícios um computador poderia trazer-lhes;
e em outra, pelo medo de penetrar em um terreno desconhecido. Está
se tornando cada vez maior o número de pessoas que compram um computador
sem ter uma idéia precisa do que fazer com ele, o que é,
na verdade, mais importante que saber ligar o aparelho. Tal fato evidencia-se
ainda mais nas profissões onde o contato diário com computadores
é pequeno. Na área médica há ainda outro agravante:
o médico, em geral, tem dificuldade em encontrar tempo para aprender
a trabalhar com o computador.
No Brasil, a introdução do
uso de computadores na Medicina é relativamente recente. Os sistemas
hospitalares, quando existem, limitam-se ao controle de assuntos administrativos
como cobranças, faturamento, controle de leitos, etc. Raros são
os casos onde o médico tem um contato direto com o computador. No
entanto, a tendência mundial é que esta interação
seja cada vez mais freqüente. Em alguns hospitais dos Estados Unidos,
o médico usa diariamente o computador na requisição
e consulta de exames, preenchimento e consulta ao prontuário dos
pacientes, comunicação com outros colegas pelo correio eletrônico,
acesso a bases de dados bibliográficos como o MEDLINE, levantamento
de dados epidemiológicos e para fins científicos, edição
de textos, confecção de slides, etc.
Nos consultórios particulares, é
cada vez mais freqüente o uso de computadores no cadastro e armazenamento
de dados clínicos dos pacientes. Nestes casos, o computador permite
uma leitura mais rápida e legível das informações,
sendo também possível o armazenamento de imagens de exames.
As prescrições e folhas de orientação passam
a ser mais legíveis e personalizadas com o uso de programas de auxílio
à prescrição e impressoras de boa qualidade. Outras
possibilidades surgem com o uso dos bancos de conhecimentos médicos,
os quais auxiliam a prática clínica fornecendo informações
rápidas sobre medicamentos, exames especializados, patologias e
seu tratamento.
Portanto, o computador, quando utilizado
adequadamente, transforma-se em caneta, fichário, biblioteca e agenda
do médico, com várias vantagens em relação
aos métodos manuais. Neste artigo discutiremos alguns dos aspectos
práticos mais relevantes que o médico deve saber para informatizar
o seu consultório.
Estratégia
de informatização
Quando pensamos em informatizar uma clínica
ou consultório, devemos responder quatro questões:
-
Por quê?
-
O quê?
-
Quanto?
-
Como?
Por quê informatizar?
Pense nas tarefas em que o computador pode
lhe auxiliar. Entre as mais comuns podemos citar:
Grande volume do arquivo tradicional
- as fichas cadastrais e clínicas dos pacientes ocupam muito
espaço físico e gasta-se muito tempo recuperando-as de um
fichário tradicional. A organização das fichas em
meio eletrônico permite a consulta quase instantânea das mesmas.
Otimização de recursos
humanos - secretárias, assistentes, administradores, enfermeiras
e médicos podem realizar suas tarefas mais rapidamente, assim o
tempo destes profissionais é melhor aproveitado.
Melhoria na qualidade dos impressos
- prescrições, orientações, atestados,
laudos, encaminhamentos, recibos, relatórios e outros impressos
podem ser emitidos pelo computador, aumentando a rapidez e legibilidade
dos mesmos.
Auxílio na explanação
ao paciente - imagens e vídeos digitais, organizados e guardados
em meio eletrônico podem auxiliar na explanação ao
paciente sobre sua patologia ou procedimento a ser realizado.
Modernidade - hoje o computador
faz parte de nossa vida, e cada vez vai ser mais comum sua presença
em todos os setores da sociedade, trazendo uma imagem de bom uso da tecnologia
para quem o possui.
É importante que se estabeleça
objetivos claros a ser atingidos com a informatização. Assim,
pode-se avaliar o grau de sucesso obtido no processo.
O quê informatizar?
São várias as tarefas que podem
ser informatizadas. Na recepção temos o agendamento e cadastro
dos pacientes, emissão de recibos, guia de exames; na área
contábil e administrativa, o faturamento particular e de convênios,
controle de caixa e de materiais; na área clínica, o prontuário
dos pacientes, emissão da prescrição, orientações,
encaminhamentos, aquisição de imagens, acesso a bancos de
informações médicas como CID, medicamentos, MEDLINE
e outros, utilizando ou não a Internet.
Quanto gastar na informatização?
Ao fazer o cálculo do investimento
esperado, devemos levar em conta os objetivos e os setores a serem informatizados.
Assim, podemos estabelecer com mais segurança os equipamentos e
o software necessários para a informatização. Porém
o cálculo não termina aí. É muito importante
considerar o custos com treinamento e manutenção, freqüentemente
esquecidos mas também importantes no custo final.
Como informatizar?
Se você conseguiu responder satisfatoriamente
às perguntas anteriores e está seguro quanto às vantagens
que a informatização vai lhe trazer, poderá então
começar o processo de aquisição e implantação.
Pense ao mesmo tempo em quatro aspectos que estão muito relacionados:
aquisição do equipamento, aquisição dos programas,
treinamento e manutenção do sistema. Um ponto é muito
importante: não faça uma revolução autoritária
na sua clínica. Procure conversar com os médicos e funcionários
sobre os benefícios que a informatização poderá
lhes trazer e esteja aberto para sugestões. A mudança é
sempre um processo delicado e costuma trazer problemas se não tratada
com a devida atenção.
Escolhendo o Equipamento
Ao escolher o `hardware', é importante
levar em conta sempre a relação custo/benefício. Se
não é necessário adquirir o computador mais veloz
de último tipo não o faça, pois esses equipamentos
são caros e sua velocidade de depreciação é
maior que um computador um pouco menos potente, mais barato, mas que resolve
todos os seus problemas. Leve em consideração a confiabilidade
da marca, garantia, a existência de assistência técnica
na sua cidade, a possibilidade de expansão (`upgrade') e
o preço. Neste número da revista "Informática Médica"
você poderá ler outro artigo sobre "Como
escolher o microcomputador ideal" e conhecer mais detalhes e dicas
de como realizar um boa aquisição de seu equipamento.
Você precisa
de uma rede?
Redes locais são sistemas onde os microcomputadores
são conectados entre si, possibilitando intercâmbio de informações
e compartilhamento de recursos. Cada computador é um equipamento
independente, com seu próprio microprocessador, mas os dados gravados
no disco de um deles podem ser acessados pelos outros. O mesmo acontece
com as impressoras, que se conectadas a um computador, podem receber trabalhos
vindos de outros pontos da rede. Obviamente, estes recursos não
são compartilhados livremente. Configurações de senhas
e direitos são estruturadas para garantir a segurança e o
sigilo da informação.
Hoje temos basicamente dois tipos de arquitetura
de rede: cliente-servidor e ponto a ponto. No primeiro, temos um computador
central (servidor) dedicado a basicamente uma única tarefa: servir
como depósito de dados que podem ser acessados a partir de qualquer
micro ligado a ele. Como os servidores costumam ser máquinas potentes,
com grande capacidade de memória central (RAM) e em disco, estas
redes têm um custo maior de instalação e manutenção,
mas permitem a conexão de um grande número de computadores.
No segundo tipo, não precisamos de um servidor dedicado. Os microcomputadores
se "enxergam" entre si, compartilhando dados e recursos. As redes ponto
a ponto são mais baratas que as cliente-servidor, exigem menos manutenção
e são mais fáceis de trabalhar. Porém, perdem desempenho
quando muitos computadores são usados simultaneamente (o ideal é
que uma rede ponto a ponto tenha no máximo 7 computadores).
Para montar uma rede, precisamos de cabos,
microcomputadores equipados com placas de rede e um sistema operacional
de rede. Entre os sistemas de rede do mercado, podemos citar Novell e Windows
NT, para redes cliente-servidor, e Personal Netware, Windows 95/98 e Lantastic,
como exemplo de redes ponto a ponto.
A tabela abaixo resume as características
dos dois tipos de rede descritos anteriormente:
Equipamento necessário
para instalar redes locais
Microcomputadores
O modelo dos microcomputadores pode ser 486
até Pentium ou Pentium. A escolha das estações depende
de quanto se quer gastar e quais as atividades a serem realizadas em cada
uma delas. Estações onde se deseja trabalhar com interface
gráfica (Windows), exigem micros mais potentes.
Para as redes cliente-servidor, ainda é
necessário um servidor Pentium, com grande capacidade de disco rígido
e memória RAM.
Vale lembrar que microcomputadores inferiores
ao modelo Pentium não são mais encontrados no mercado, o
que não impede você possa aproveitar um 486 adquirido anteriormente
como terminal, principalmente em atividades que exigem menos do computador
(recepção, por exemplo).
Cabos e conectores
Para conectar as estações entre
si (redes ponto a ponto) ou ao servidor, precisamos de cabos e conectores.
Dois tipos de cabo podem ser utilizados: coaxial ou par trançado.
O cabo coaxial permite a montagem de uma rede do tipo barramento, onde
o mesmo cabo conecta todas as estações uma por uma. Esta
configuração tem um menor custo, mas menor eficiência,
pois defeitos em qualquer ponto do barramento levam à interrupção
do fluxo de dados em qualquer estação ligada a este barramento.
O cabo tipo par trançado é usado nas redes "em estrela".
Neste caso, cada micro é conectado por um cabo independente. Assim,
se um cabo apresentar problemas, somente a estação conectada
a ele perde o acesso, não influindo no comportamento das demais.
Para ligar os cabos às placas de
rede nos micros usa-se conectores. Cada tipo de cabo usa um tipo diferente
de conector.
Placas de Rede
As placas de rede são adaptadores internos
que permitem conectar os cabos nos microcomputadores. Ao comprar o equipamento,
solicite para que já venham com placa de rede instalada, a fim de
evitar custos posteriores para instalação e configuração
das placas.
Sistema Operacional de Rede
Antes de escolher o sistema operacional da
rede, deve-se decidir pela arquitetura de rede: ponto a ponto ou cliente-servidor.
Nas redes cliente-servidor é importante saber quantas estações
estarão ligadas ao servidor, pois o preço do sistema operacional
varia de acordo com este número.
Escolha dos programas
Sistema de consultório
A escolha do sistema de consultório
é uma etapa muito importante na informatização, pois
a conversão para outro sistema requer custo e sacrifício.
Para facilitar sua escolha elaboramos um roteiro de perguntas a serem feitas
ao analisar um sistema.
-
As funções do programa satisfazem
suas necessidades?
-
Qual o tempo da empresa no mercado? Tem boa
reputação?
-
Em que áreas a empresa atua além
da área médica? (quanto mais específica a atuação
na área médica maior o interesse da empresa em dar continuidade
ao trabalho)
-
Há quanto tempo foi lançada
a primeira versão do programa? Em que versão está
no momento?
-
Quantas cópias já foram comercializadas?
-
Qual o custo do programa e o que está
incluído neste custo (instalação, garantia, suporte,
etc.)? Existe um custo adicional de acordo com o número de comutadores?
-
Existe garantia de suporte e atualizações?
-
A empresa dará continuidade no desenvolvimento
do sistema, acompanhando as novas tecnologias? Qual será o custo
das atualizações?
-
Quais as configurações mínima
e recomendada de computador para `rodar' bem o programa.
Aplicativos de uso geral
Há vários programas que podem
ser necessários dependendo de sua demanda. Editores de texto, planilhas
eletrônicas para contabilidade, análise estatística
e criação de gráficos, editor de slides e agenda pessoal
são alguns exemplos de aplicativos muito usados. Eles podem ser
encontrados juntos em um mesmo `pacote' (Office da Microsoft, Lotus Smart
Suite, etc.) que tem como vantagem um preço menor do que se adquiridos
separadamente. Se você tem vínculo acadêmico há
lojas que oferecem grandes descontos. Se você está pensando
em se ligar à Internet, há necessidade de programas que realizem
esta função. Em geral as empresas provedoras de acesso à
Internet já oferecem esses programas quando você abre uma
conta.
Sistema
Tot-Win: para informatização de consultórios
Sistema
X-Clinic: clínicas de Radiologia
Treinamento
O simples fato de ter computadores e uma variedade
de programas não significa que eles serão úteis ou
que serão utilizados adequadamente. Para que isto ocorra é
necessário suporte e treinamento adequados. Esta conduta possibilita
que o equipamento seja utilizado da melhor maneira possível, prevenindo
perdas de dados e diminuindo (mas não excluindo) a necessidade de
assistência técnica externa.
Atualizações
do Sistema
A Informática é uma das tecnologias
que apresenta evolução e renovação mais rápidas.
Sistemas que hoje se mostravam suficientes, daqui há alguns anos
já serão obsoletos. Hoje as exigências da maioria dos
médicos se resumem a controle de faturamento, armazenamento dos
dados dos pacientes e prescrição eletrônica, mas bases
de dados com informações médicas, sistemas com comando
por voz e computadores de bolso serão recursos básicos mínimos
em um futuro muito próximo. Embora as atualizações
sejam importantes, deve-se ter em mente que a simples garantia de realização
das mesmas não é suficiente. É preciso que os dados
anteriormente digitados possam ser utilizados sem problemas pelos novos
sistemas que aparecerem.
Tendo em vista as considerações
acima, ao optar por um sistema informatizado, deve-se pensar no seguinte:
-
Se você não é acompanhado
por uma empresa séria de desenvolvimento, o que será de seu
sistema em dois anos?
-
Será que você nunca mais vai
precisar alterar o sistema para atender às suas necessidades?
-
Se você precisar incluir novos módulos,
quem o fará? Qual será o custo? O sistema funcionará?
-
Se o sistema deixar de atender às suas
novas necessidades você precisará reinvestir em um novo software?
-
Se você trocar o sistema, quem converterá
os seus dados? Será que tudo terá que ser redigitado?
Você terá que reinvestir em treinamento
de todos os funcionários? Se você precisar de suporte e orientação
de informática, a quem você poderá recorrer com confiança?
Existem ainda outros ítens a serem checados para dar maior segurança
à aquisição do software. Contrate um consultor profissional,
se for preciso.
Suporte Técnico
Como dito anteriormente, a informatização
de um consultório não termina na aquisição
de hardware e software. Os custos com estes itens são mínimos
quando comparamos com o valor que adquirem quando passamos a guardar nossas
informações neles. Nicolas Negroponte, fundador do MIT Media
Lab, um dos centros computacionais mais avançados do mundo, conta
em seu livro "A Vida Digital" um fato que ilustra bem esta afirmação:
Ao se hospedar num hotel, Negroponte pede
à recepcionista que guarde seu "notebook" num local seguro. A recepcionista
pergunta o valor do equipamento e ouve, estarrecida, Negroponte declarar:
"por volta de 2 milhões de dólares!" Negroponte se justifica:
"Nas lojas o seu preço não chega a mais que 2 mil dólares.
O que vale milhões são as informações que estão
aí guardadas!".
Implantar um sistema de informática
sem treinamento, garantia de atualizações e suporte técnico
eqüivale a comprar um automóvel admitindo-se que não
é preciso aprender a dirigir, nem realizar manutenção
periódica e, muito menos, fazer um seguro do carro.
Esperamos que estas dicas possam lhe ajudar.
Sucesso na informatização !
Para Saber Mais
Caramel, E., Sachetto, T. e Matias, L.J.D.
- Como
escolher o computador ideal. Jornal de Informática Médica.
Del Fiol, G. e Matias, L.J.D. - Como
informatizar sua clínica. Jornal de Informática Médica.
Ilha, J.O. e Sabbatini, R.M.E.: Informatizando
a Saúde Ocupacional. Revista Informática Médica
1(1), janeiro/fevereiro 1999.
Sabbatini, R.M.E. - Informatizando
o Consultório Médico. Revista Informática Médica,
1(4), julho/agosto 1999.
Sabbatini, R.M.E. - Consultório
Portátil. Revista Informática Médica, 1(6),
novembro/dezembro 1999.
Sabbatini, R.M.E. e Ortiz, J. - MEDSARR:
Um Sistema para a Informatização Clínica. Revista
Informédica, 2 (10): 5-12, 1994. |