A utilização da Informática na gestão hospitalar evoluiu, nos últimos 25 anos, de uma situação em que o computador era utilizado para a realização de tarefas relativamente simples e isoladas entre si, até o atual nível de integração global, na qual se procura unir, através de um sistema único, os diversos pontos de geração e utilização da informação dentro da organização clínica. O estado-da-arte da informatização dos hospitais reside, portanto, nos denominados Sistemas de Informação Hospitalar (SIH).
Um SIH típico pode ser descrito como "um sistema de informação computadorizado, instalado em um ambiente hospitalar, com o objetivo de registrar informações sobre os pacientes, de tal forma que possam ser compartilhadas por todos os setores do hospital que delas necessitem".
Nesse contexto, é importante que a comunicação via computador se dê de tal forma, que todas as solicitações feitas por médicos, ou por outras pessoas envolvidas no processo de assistência, diagnóstico e tratamento do paciente, estejam imediatamente disponíveis para os diversos departamentos e serviços hospitalares, assim que a informação estiver pronta para ser incluída no prontuário (manual ou eletrônico) do paciente.
Portanto, torna-se evidente, a partir dessa definição, que o compartilhamento das informações e a automação da comunicação dentro de um hospital constituem a chave para o sucesso dos SIH atuais.
Nos EUA, o Sistema de Informação Hospitalar típico está instalado em um hospital de 200 ou mais leitos, sendo que comumente subserve uma ou mais das seguintes funções básicas:
Em resumo, um SIH moderno, tal como o descrevemos até aqui, trata os problemas básicos de registro de pacientes, as informações para elaboração de estatísticas e/ou relatórios, um resumo dos diagnósticos, das terapias realizadas, das informações cirúrgicas e das comunicações ordens/resultados, para dar suporte ao processo de tratamento. Podemos dizer que as funções descritas acima se constituem como a base fundamental de um SIH, uma vez que certamente a maior parte dos hospitais fazem uso dessas funções.
O desenvolvimento de SIHs começou nos anos 60, nos grandes hospitais-escola dos EUA e Europa. Com os custos do hardware e do software então disponíveis, somente grandes instituições podiam arcar com o investimento requerido para um computador suficientemente grande para a execução das funções descritas até aqui. Posteriormente, grande número de software-houses e system-houses especializadas, em muitos países, assim como muitos fabricantes de hardware de grande e médio porte, passaram a oferecer sistemas "turn-key" (para pronta operação) de informação hospitalar, genéricos e especializados. A solução adotada na época (que ainda continua sendo utilizada em vários países, inclusive no Brasil) foi a do sistema totalmente centralizado (Fig. 1). A atual situação, caracterizada por uma notável diminuição na relação custo/desempenho de sistemas computacionais de menor porte, levou o mercado norte-americano para SIHs ao valor de mais de US$ 5 bilhões anuais.
Vamos examinar agora como se processariam as atividades típicas dentro de um sistema computadorizado de comunicação intra-hospitalar:
Deve-se chamar a atenção para o fato de que, no caso exemplificado, algumas comunicações foram completadas através do Sistema de Informação Hospitalar, enquanto outras continuaram sendo feitas de forma tradicional (manual).
Devido ao aumento na potência de processamento dos micro- e minicomputadores e à diminuição na relação preço/desempenho, mais e mais hospitais com menos de 200 leitos, nos países mais desenvolvidos, têm implantado sistemas descentralizados, ou distribuídos de informação hospitalar (Fig. 2). Esses sistemas se caracterizam por assumir tarefas locais de gerenciamento da informação (através de computadores departamentais, contendo programas dedicados para o laboratório de análises, para a farmácia, para o serviço de nutrição, radiologia etc.).
Esses sistemas podem operar tipicamente em modo stand alone (autônomo), o que significa que os dados podem ser acessados somente no departamento que lhes deu entrada. Para dar uma solução a este problema, os sistemas departamentais passam a ser integrados por um meio de um sistema global, ou rede de informação hospitalar. Assim, não perdem sua autonomia, tão prezada pelos administradores locais; em contrapartida, podem compartilhar seus dados com os de outros departamentos.
O fator mais importante no projeto de SIHs (principalmente se a implementação dos seus diversos módulos for gradativa) é o estabelecimento de uma interface de software eficiente.
Para um sistema de gerenciamento da farmácia, por exemplo, uma interface com o Sistema de Informação Hospitalar central permitirá o acesso ao registro do paciente, com suas requisições e prescrições de medicamentos. O sistema específico de gerenciamento da farmácia, por sua vez, terá funções específicas para prover informações sôbre interações entre drogas, emitir relatórios estatísticos sobre utilização dos medicamentos estocados, gerenciar os estoques, etc. Finalmente, o envio de informação no sentido contrário é realizado quando o sistema da farmácia for capaz de atualizar automaticamente o prontuário dos pacientes quanto ao perfil de medicamentos consumidos.
Existem sempre uma ou mais maneiras viáveis de implementar as possibilidades apontadas até aqui, na maioria dos hospitais. A análise de viabilidade, realizada caso a caso, apontará a melhor mistura de hardware e software a ser utilizada, de acordo com a capacidade financeira e as prioridades estabelecidas pela direção do hospital.
Sabemos que muitas das soluções propostas para a implementação prática de um SIH tem encontrado graus variáveis de sucesso. Não há, infelizmente, um consenso universal sobre qual é o melhor caminho a ser seguido, e muitos problemas ainda aguardam uma solução mais eficiente.
Um dos problemas a ser resolvido é o da facilidade e naturalidade da interação usuário-máquina. Existem aqui diversas peculiaridades, próprias do meio hospitalar. A operação de um SIH a partir das estações de trabalho da enfermagem, por exemplo, normalmente faz uso de terminais de vídeo simples, equipados com teclados como única via de entrada de dados. O problema é que a maioria dos profissionais de Saúde não foram treinados para usar eficientemente um teclado; além do fato que a sua velocidade de entrada de informações é relativamente baixa.
Para facilitar a interação usuário-máquina, seria interessante utilizar mais extensamente dispositivos alternativos de entrada, tais como telas sensíveis ao toque, canetas ópticas, etc. Estações de trabalho mais "inteligentes" permitiriam uma interação mais efetiva e rápida, com um mínimo de treinamento formal.
Outro problema comumente encontrado em muitos SIH é que as informações sobre os pacientes são registradas nas áreas administrativas das estações de trabalho da enfermagem. Assim, a confirmação do cuidado dispensado ao paciente, conforme as ordens passadas pelo Sistema, deve ser feita manualmente na ficha do paciente que está junto ao leito. Posteriormente, o procedimento ou resultado é registrado no sistema central. Isso representa uma duplicação desnecessária e indesejada de uma tarefa relativamente simples. Aumenta o potencial de erros de transcrição, bem como o retardo entre geração e registro da informação. Muitos hospitais americanos já perceberam que, para eliminar esse problema, o ideal seria entrar com os dados do paciente, imediamente junto ao seu leito. Assim, criou-se o conceito de "bedside terminal" (terminal junto ao leito), que é uma tendência claramente verificada, a medida que os preços dos terminais "burros" ou "inteligentes" diminui drasticamente de um ano para outro.
Podemos afirmar, no entanto, que apesar da queda de preços, e das vantagens oferecidas, essa é uma solução ainda muito cara para a maioria dos hospitais. Na impossibilidade de se colocar terminais junto a cada leito do hospital, uma boa solução parece ser o computador portátil ("lap-top"), levado de leito em leito pela enfermeira encarregada das anotações médicas. Posteriormente, o micro portátil é conectado ao computador central através de um cabo simples, e transmite os dados armazenados durante a ronda.
Um outro esquema de entrada de dados que aparece atualmente como uma promessa é o de utilização de técnicas de reconhecimento de voz, onde uma pessoa pode ordenar um procedimento laboratorial simplesmente falando junto a um microfone. Um programa especial de reconhecimento de voz identifica e traduz a ordem, e a transmite ou armazena como se tivesse sido digitada ao teclado. Entretanto, atualmente não existem sistemas acessíveis, comercialmente disponíveis, para reconhecimento contínuo de voz, independente do locutor. Os sistemas existentes exigem que padrões de voz tenham sido armazenados previamente e só as vozes reconhecidas pelo sistema podem emitir ordens.
Ao descrevermos o SIH tal como existe hoje e sua evolução, examinamos basicamente os aspectos técnicos relativos ao armazenamento de dados e sua comunicação. Não se previu no sistema nenhum tipo de análise ou interpretação computadorizada de dados (embora já existam alguns sistemas capazes de realizar essa função de forma restrita, como o HELP, e o RMR). Essas funções, até o presente, tem sido relegadas ao profissional de atenção à saúde.
O aparecimento de microcomputadores deu lugar a sistemas acessíveis de suporte à decisão médica. Eles só podem ser utilizados onde exista processamento de um volume pequeno de dados. Departamentos como o de Função Pulmonar, Radioterapia, Eletroencefalografia, etc. mostram-se adequados para o uso de microcomputadores.
Para obter vantagens do aumento no número de sistemas de suporte à decisão em micros é necessário que o SIH central tenha as interfaces necessárias para fornecer dados demográficos sôbre o paciente, assim como processar transmissão de ordens e resultados subsequentes. Um conceito chave para o SIH é a coexistência, em um mesmo ambiente, de diferentes protocolos de comunicação e formatos de mensagens.
Para dar suporte aos profissionais de saúde, o SIH, assim como os recursos imediatos disponíveis para comunicação no cuidado do paciente, deve prever a facilidade de acesso a bancos de dados externos, tal como ao MEDLINE (referências bibliográficas em Saúde), ao Centro de Contrôle de Intoxicacões, etc. Sistemas de comunicação via satélite permitem o acesso a bancos de dados internacionais.
Com a implementação de sistema de informação hospitalar é agora possível resolver problemas mais complexos no processo de atendimento ao paciente. Um problema desse tipo pode ser exemplificado pela situação comum em que um paciente foi marcado para tratamento em dois diferentes locais ao mesmo tempo, ou quando se pediu para esse paciente dois procedimentos de natureza tal que, se forem efetuados numa sequência incorreta, levarão à resultados indevidos.
Essa é uma área que o sistema departamental baseado em um microcomputador não é capaz de atender, pois não tem possibilidade de integrar e verificar dados e informacões com outros sistemas departamentais isolados. Para se fazer um planejamento adequado dos recursos do hospital é necessário identificar todos os possíveis conflitos entre os profissionais de atendimento ao paciente, técnicos, equipamentos, salas, etc. O problema é muito complexo, uma vez que tudo isso acontece de forma dinâmica no hospital, com constantes adicões e cancelamentos de recursos ou de sua utilizacão. Para controlar esse ambiente dinâmico, espera-se do Sistema de Informações Hospitalares um agendamento eficiente dos compromissos dos médicos, técnicos, equipamentos e salas, juntamente com algorítmo para encaminhar, notificar ou resolver conflitos, quando eles ocorrerem.
Desde o desenvolvimento dos primeiros Sistemas de Informação Hospitalar tem havido o desejo de colocar neles a história clínica completa dos pacientes, para fins de recuperação individual ou em grupo, para pesquisa. O armazenamento de todos os dados demográficos, exames e resultados, mais as anotacões da enfermagem e dos médicos, por vários anos, eleva a níveis proibitivos os custos do hardware do sistema, uma vez que tudo isso forma um volume imenso de informacão, mesmo para hospitais pequenos. Os custos dos dispositivos de massa para armazenamento dos dados ainda são muito altos. Mesmo o armazenamento de apenas alguns dados clínicos relevantes é difícil, uma vez que não é fácil chegar a um consenso sobre que dados devem ser armazenados. O resultado disso é que o prontuário médico manuscrito continua sendo o documento primário para armazenamento sobre o paciente.
Presentemente, o aperfeiçoamento das tecnologias ópticas para armazenamento de dados (discos laser) poderá permitir realizar o sonho de ter todos os dados dos pacientes armazenados indefinidamente no sistema. Usando um disco CD-ROM (Compact Disk Read Only Memory) com uma capacidade de 550 Mbytes, um manuscrito de 297.000 páginas de tamanho normal pode ser armazenado. A estrutura é flexível de tal forma que um "scanner" de imagem pode armazenar o "facsimile" de um registro ou filme de raio X ou um "scanner" de caracteres pode ser usado para converter cada caracter da página em código binário para armazenamento. As implicações para isso são revolucionárias, uma vez que podem vir a resolver o problema de prontuários médicos não disponíveis ou perdidos, como também possibilitar a consulta a imagens de raio X e representações gráficas tal como ECG. A tecnologia do CD-ROM está disponível tanto para grandes Sistemas de Informações Hospitalares como também para micros departamentais. Histórias anteriores narram que a capacidade de armazenamento impressivo aumenta por fatores de aperfeiçoamento de tecnologia. A disponibilidade de tecnologia do CD-ROM torna possível o armazenamento de grandes bases locais assim como a conexão do Sistema de Informações Hospitalares a bancos de dados externos.
Uma outra técnica de armazenamento que o Sistema de Informações Hospitalares pode ter é a preparação e elaboração de Smart-Card, um cartão de de tamanho a um cartão de crédito codificado com dados demográficos do paciente assim como informações chaves sobre a saúde do paciente. Os dados no cartão devem conter informações a respeito de alergias, prescrição de drogas recentes, informações chaves de laboratório, assim como resultados dos procedimentos realizados. Se essa técnica pudesse ser utlizada daria a um profissional de atenção médica um panorama rápido dos cuidados médicos anteriores prestados ao paciente, eliminando a duplicação de exames e procedimentos. Existem, atualmente, cartões "inteligentes" baseados na em tecnologia optica, que são capazes de armazenar até 200 Mbytes de informação em um único cartão. Dessa forma, é viável armazenar praticamente todo o prontuário do paciente, inclusive imagens médicas, traçados de sinais biológicos, resultados de exames de laboratório e demais textos associados ao processo da assistência. É o "prontuário médico de bolso", que poderá ser portado pelo paciente à medida que visita diferentes instituições de prestação de serviços de saúde.